4 de maio de 2010

O que esperar de uma exposição sobre Hélio Oiticica?




O Museu é o Mundo... Esse é o nome da exposição retrospectiva do artista Hélio Oiticica no Instituto Itaú Cultural.

Mas que mundo é este trazido por meio desta exposição?

O que de Hélio Oiticica realmente encontramos naquele espaço?

O Hélio questionador, propositor e provocativo está ali?

Ou estamos diante de uma alegoria do que foi e do que é o trabalho deste artista?

Durante a visita a exposição, tudo parecia que poderia ser ou estar de outra maneira.

O mais chocante ao entrar foi me deparar com aquelas araras, que primeiro me pareciam de mentira, dentro de uma grade, como um zoológico, no subsolo, ou seja elas quase não viam a luz. Pior ainda, pois faziam parte de um dos ambientes/instalação mais importantes para a História da Arte Brasileira, A Tropicália. Como um artista como Hélio, que propõe que o museu é o mundo, concordaria em refazer uma de suas obras emblemáticas colocando uma grade para fazer parte deste ambiente? O quanto esta montagem me incomodou! Como se as grades e aquelas araras estivesse ali para dizer: Nada é como ele pensou. Nós adaptamos. Nós normatizamos.

Já que não poderia ser do jeito que o artista planejou será que esses animais eram imprescindíveis? Então que seja assumidamente de mentira. O falseamento se intensifica, os Bólides do artista, obras feitas para o visitante experimentar sensações, neste andar, não poderiam ser tocados, estavam em pedestais, sacralizados. O ato de colocar um Parangolé – que em sua origem tinha um sentido político de se apropriar tanto de uma peça de arte quando do espaço da arte, o museu – também foi adulterado. Neste espaço coloco o parangolé e me olho no espelho, como uma roupa que eu compro ou um objeto de consumo.

Quem sabe os Penetráveis parecem mais verdadeiros do que o restante da exposição, como se ali todo o desejo do artista tivesse sido preservado. Isto aconteceu porque estas obras são lugares de isolamento, você entra em uma caixa e parece que o seu olhar e suas sensações são conduzidas ali. Eles se isolam do mau comprometimento entre a exposição e as obras, entre a intenção e a proposta do artista.

De fato, A pureza é um mito, como disse o próprio artista. Os obras de Hélio Oiticica foram violadas, como se o sagrado virasse profano, um ato político e consciente virasse mero entretenimento e o questionamento, este também virou mercadoria.

O museu é o mundo...




Sabemos, mas do que corrente em bocas miúdas, que Oiticica foi um grande polemizador da arte nacional. O Itaú Cultural, na exposição O Museu é o Mundo, traz uma retrospectiva desse grande artista. De colorista abstrato, de questionador de formas e planos passa a questionador das emoções. Apesar de nos dias atuais parecer-nos mais do que coerente esta trajetória artística, não o era em seu período. Bem possível que instigado pelas relações com outros artistas companheiros seus, como Lygia Clark e Lygia Pape, se propôs a transformar o olhar do observador através do seu próprio olhar.

Muito mais que provocador, Oiticica era um ser inquieto, em constante transformação. Por que não transmitir essa inquietude a quem buscava em suas obras um olhar distinto das tradicionais figurações nacionalistas? Por que não exprimir muito mais do que fatos vistos, mulatas lascivas e sofrimentos regionalistas degastadamente apresentados pelas linguagens ultrapassadas de uma vanguarda que se transformou de novidades modernistas em tradicionalismo estético?

Se o que estava em discussão não era mais o que víamos pelo mundo afora, por que não nos virarmos para o mundo adentro?

O que Oiticica e os demais buscam são as experimentações do corpo, as sensações do eu, a conduta Merleau-Pontiniana do estar no mundo e nele se envolver fenomenologicamente. Se assim o é, o plano bidimensional já havia esgotado suas relações ou, ao menos, limitava as possibilidades de existência humana em seu quadrilátero imaginário. A trajetória da bidimensionalidade para a tridimensionalidade de Oiticica está bem próximo à quebra da quarta parede no teatro. O público não somente assiste o espetáculo, mas participa dele. Retira-se o véu, desobstrui os canais, permite os sentidos experimentados, não somente vistos. Recria o simulacro do mundo em seu próprio mundo. Faz da vida a caixinha de tubos imagéticos, o mundo se torna emoldurado pelo recepiente televisivo.

Talvez seja isso o mérito de Oiticica, como o de Warhol, perceber que o mundo não seria mais como já foi, natural. A partir daquele período, o mundo tornar-se-ia, ele próprio um grande reality show, mas reality de onde?


2 de maio de 2010

Eletric Chairs, Mr America???

Andy Warhol, Eletric Chairs, 1964.

Eu sei... Muitos posts sobre Andy Warhol e sobre Mr. America estão sendo feitos, mas como evitar um tema tão pungente. O ano de 2010, em termos expositivos poderia finalizar por aqui, de tão intenso que já foi e ainda está sendo. Rauschenberg, Chagall, Oiticica, Max Ernst e Warhol, se não bastasse ainda vêm por aí Keith Haring, Joseph Beuys e Bienal de São Paulo. Contudo vamos a pauta proposta.

Por mais que a mídia discuta o poder marqueteiro de Andy Warhol, a exposição que está viajando pela América Latina traz boas obras do artista. Algumas das mais conhecidas como as “Latas de Sopas Campell”, as “Marilyns”, “Jack Kennedy”, entre outras fazem o frisson da exposição; contudo impressiona-me muito mais dois pontos, a possibilidade de perceber a aplicação das técnicas de pintura, assim por dizer, a serigrafia e o stencil, e os vídeos produzidos durante o período da Factory – em um post para frente falarei em especial de Blowjob.

Sabe-se muito bem que muitas das obras de Warhol foram conduzidas pelo artista e executadas por oficineiros com qualidades técnicas que o artisa provavelmente não possuia. Este primor técnico é revelado pelas obras que apresentam uma qualidade visual impressionante.

Vou citar uma especial. Da série Eletric Chairs, há uma das serigrafias que possui um fundo amarelo – cabe aqui um aparte: observá-las in loco percebe-se que as serigrafias, de um modo geral, não são realizadas com cores; o fundo é colorido, enquanto elas sempre são impressas em preto -, esta peça se destaca pelo domínio do artista sobre o que está querendo expor, nela ele utiliza o processo de negativação da imagem - como se parecessem com os antigos negativos de uma fotografia analógica - e consegue transformá-la em imagem positiva, como a própria foto. Tal coisa se revela e somente quando se vê ao vivo, não em reproduções.

Assim, enquanto achava que era somente uma constatação ir à exposição, novamente Warhol me surpreende, muito além da temática, das questões do movimento Pop Art ligadas ao tema, objeto e cotidiano, esbarrei com um ponto crucial dos antigos artistas, a bem feitura das obras. Quem diria, hein, Warhol?